maio 18, 2025 | by Ronaldo dos Reis

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) adotou uma medida que compromete a transparência na gestão de recursos públicos ao restringir o acesso a cerca de 16 milhões de documentos relacionados a convênios firmados com estados, municípios e organizações não governamentais (ONGs). A decisão, revelada pelo jornalista Tácio Lorran, do portal Metrópoles, inclui a ocultação de informações sobre emendas parlamentares, mecanismo frequentemente associado a negociações políticas. A justificativa apresentada pelo governo é a necessidade de adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), mas a falta de clareza e de um prazo para a retomada do acesso levanta suspeitas sobre as reais intenções da medida.
Entre os documentos agora inacessíveis estão termos de convênio, pareceres, subcontratos, planos de obra, croquis, certidões, estatutos, recibos e notas fiscais. Esses arquivos, antes disponíveis na plataforma TransfereGov, permitiam que cidadãos, jornalistas e órgãos de controle acompanhassem a aplicação de recursos federais, estimados em R$ 600 bilhões. A retirada desses dados representa um apagão de informações, dificultando auditorias independentes e investigações sobre possíveis irregularidades. Especialistas em transparência pública classificam a medida como uma violação da Lei de Acesso à Informação (LAI), que garante o direito à consulta de dados governamentais.
A decisão contraria diretamente as promessas de campanha de Lula, que em 2022 criticou o sigilo imposto pelo governo de Jair Bolsonaro e se comprometeu a ampliar a transparência. Em maio de 2023, durante evento no Palácio do Planalto, o presidente afirmou que “sem transparência, não há democracia”. A atual restrição, portanto, gera questionamentos sobre a coerência do discurso governamental e alimenta desconfianças de que a medida busca proteger interesses políticos em meio a denúncias de corrupção.
A ocultação dos documentos ocorre em um momento delicado para o governo, marcado por investigações que apontam irregularidades bilionárias no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal, revelou fraudes em descontos indevidos em benefícios previdenciários, com desvios estimados em R$ 6,5 bilhões, dos quais R$ 4,1 bilhões ocorreram na gestão Lula. A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou que 97,6% dos aposentados e pensionistas sofreram descontos não autorizados, o que intensificou a pressão sobre o governo.
A coincidência entre o avanço das investigações e a restrição documental sugere, para analistas, uma tentativa de evitar novas denúncias. A medida também dificulta o rastreamento de emendas parlamentares, incluindo aquelas ligadas ao chamado “orçamento secreto”, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2022 por falta de publicidade. A ocultação de informações sobre quem recebeu, contratou ou executou recursos públicos compromete o controle social e fortalece a percepção de que o governo busca proteger aliados políticos.
O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), responsável pela plataforma TransfereGov, alega que a restrição visa proteger dados pessoais, como CPFs, endereços e e-mails, em conformidade com a LGPD. A pasta informou que está desenvolvendo uma ferramenta para anonimizar essas informações, mas não forneceu um prazo para a conclusão do processo. A Advocacia-Geral da União (AGU), no entanto, contradisse a justificativa, afirmando que seu parecer não recomenda a retirada dos documentos e que não há impedimento para que permaneçam públicos. Essa divergência reforça as críticas de que a medida é desproporcional e prejudica o interesse público.
A decisão do governo gerou reações imediatas. Parlamentares de oposição, como o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciaram a intenção de pautar projetos de lei para coibir fraudes no INSS, enquanto o senador Fabiano Contarato (PT-ES) defendeu a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar o caso, mesmo sem apoio do Planalto. Nas redes sociais, a medida foi amplamente criticada, com usuários apontando contradições com o discurso de transparência do governo.
O apagão de dados também reacende o debate sobre a eficácia do combate à corrupção no Brasil. A restrição de acesso a informações públicas limita a capacidade da sociedade de fiscalizar o uso de verbas federais, especialmente em um contexto de crise econômica e aumento da desconfiança nas instituições. Enquanto o governo não restabelecer a transparência, o “cheiro fétido” mencionado por críticos continuará pairando sobre Brasília, alimentando especulações sobre o que se busca esconder.
Fontes: Metrópoles, Poder360, O Globo, Hora Brasília.
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